Seja no início de tudo, quando pesquisamos sobre o que é criar uma história, seja no nosso quinto romance, ambientado na Grécia da década de 70, uma boa parte do nosso tempo vai ser dedicado a compreender o universo no qual estamos mergulhando.
A gente sabe que um bom texto tem especificidade, usa termos exatos, ambienta bem o leitor — seja dentro de uma sala ou dentro da mente de um personagem. Também podemos desejar que o leitor aprenda coisas relevantes com nosso romance enquanto aproveita a história, desejar passar informações corretas ou mesmo deturpar fatos propositadamente.
Tudo isso pede pesquisa.
Existe, porém, o risco da pesquisa tomar proporções descontroladas e, no meio de tanta escavação, sequer notarmos que fizemos tudo, exceto escrever. Afinal, procrastinar é como piscar os olhos: acontece sem a gente se dar conta, milhares de vezes no dia.
Na maioria das vezes é normal, e até benéfico: enquanto estamos fazendo outras coisas, nosso inconsciente provavelmente está trabalhando nas soluções que vamos precisar na hora de colocar as palavras no papel.
Porém, quando a hora de escrever não chega nunca, temos um problema.
A linha entre a pesquisa e a procrastinação é tão tênue que é difícil saber o quanto de pesquisa é pesquisa demais. Mas existe uma questão fundamental: a maior parte das boas histórias está dentro dos personagens, e não no elemento histórico ou no cenário.
Claro que, se o enredo se passa na Era Vitoriana, os diálogos, por exemplo, serão bem diferentes do que se acontecessem no ano de 1993. Em 1993, uma mulher demonstraria interesse num homem de uma maneira que em 2020 poderia ser considerado antiquado. E por aí vai.
Mas os conflitos internos, as frustrações e as alegrias são elementos atrelados à humanidade que todo personagem carrega, e independem do domínio total de um determinado campo de conhecimento.
Não estou aqui dizendo que você pode sair escrevendo sem se preocupar. Na verdade, você até pode. Na verdade, você até deve. Escreva um pouco da história sem se preocupar demais. Veja como ela avança. De repente, você percebe que já sabe mais do que pensava que sabia, ou que precisa apenas pesquisar algumas questões mais pontuais.
De repente, você se dá conta que, para sua personagem cometer um assassinato na Grécia da década de 70, seria muito legal pesquisar a situação econômica do país naquele momento, e, então, se aprofundar em um elemento específico de forma mais produtiva.
Estamos aqui no ambiente da hipótese, mas quero chamar atenção ao perigo de se perder em pesquisas como forma de fugir da escrita do texto, seja por medo de falhar, ou por não se sentir preparado. Nada substitui o exercício da escrita.
Na escrita, como na maioria das artes, a prática e a técnica se retroalimentam, e é difícil determinar o que PRECISA vir primeiro. De uma certa maneira, com a pesquisa acontece a mesma coisa: mais do que saber quando parar de pesquisar, é importante saber que sem o texto a pesquisa não vai atingir o seu propósito.
Portanto, tente perceber se você está usando a pesquisa como procrastinação. E conte para a gente aqui nos comentários que outras dificuldades você está enfrentando para escrever o seu livro.